Miguel Sousa Tavares, conhecido pela sua postura crítica e controversa, mais uma vez usou a sua coluna no Record para comentar o clássico entre Benfica e FC Porto, que terminou com uma vitória por 4-1 para os encarnados. O jornalista não poupou críticas, oferecendo a sua análise sobre o jogo e as falhas da equipa portista, com mais uma das suas opiniões polarizadoras. Como sempre, a sua intervenção suscitou reacções entre os adeptos, dividindo opiniões sobre a performance das duas equipas.
“Ele, Vítor Bruno, diz que, pela primeira vez, sentiu a equipe cansada na segunda parte do desafio da Luz. Insinuava assim que o facto de ter tido um dia de descanso a menos entre os jogos europeus poderia ajudar a compreender o naufrágio desordenado da nau portista naqueles 45 minutos que os benfiquistas baptizaram de “históricos”. Gostaria de concordar com ele, mas, infelizmente, não posso: de há muito que sinto a equipeacansada – em particular, no final dos jogos. Esse déficite de preparação física da equipa, que já aqui tinha assinalado, anda, aliás, a par com outros déficites visíveis para quem conhece aqueles jogadores e aquele clube: um déficite de preparação psíquica para aguentar firme nos momentos decisivos; um déficite de preparação das bolas paradas, que chega a originar cobranças ridículas, como se viu em Roma; um déficite de treino do guarda-redes, que faz de Diogo Costa uma estátua de cera pregada à linha de golo; e, sobretudo, um déficite de motivação colectiva e individual que contraria todo o ADN da equipa. Tudo isto acumulado, e não o cansaço, explica o desastre e a humilhação da Luz, em nada surpreendente para quem tem estado atento à evolução do FC Porto de Vítor Bruno.
Sobre a escolha do sucessor de Sérgio Conceição, não tive opinião nem a favor nem contra. Compreendi as razões da saída de Conceição, por ele próprio provocada, e compreendi bem a tentação e a solução Vítor Bruno: estava ali à mão, conhecia bem o clube e os jogadores que lá permaneceram, conhecia os métodos de trabalho existentes e era barato. Podia resultar ou não resultar: era esperar para ver. Como os sportinguistas também não tardarão a perceber, promover à primeira linha um adjunto ou aprendiz que nunca treinou na primeira Liga, que nunca enfrentou os grandes clássicos contra os rivais e os grandes desafios europeus, é sempre uma carta em branco. Passados 15 jogos oficiais, o que se pode dizer de Vítor Bruno é que é cedo de mais para o descartar sem apelo, mas não é cedo de mais para fazer soar as campainhas de alarme. Tirando o milagre da Supertaça – que nem ele nem ninguém conseguiu explicar – o FC Porto falhou em todas as chamadas importantes: em Alvalade e na Luz para a Liga, sem nunca ter disputado o resultado; na Noruega, com o Bodo Glimdt, onde o treinador fez alinhar meia reserva mostrando desconhecer por completo o adversário e alguns jogadores se exibiram como se fossem dar um show de passagem pelo Ártico; e contra o Manchester United e a Lazio, em que treinador e jogadores, não só tiveram medo de ganhar os jogos, como também não foram capazes de, ao menos, defenderem os pontos até ao apito final. Uma equipa que se quer grande e que em cinco jogos grandes perde quatro e se deixa empatar no último minuto do quinto, não vai a caminho de coisa alguma.
Diz agora também Vítor Bruno que é preciso “reflexão”. Parece que nisso estamos todos de acordo e, para além do que já deixei refletido acima, acrescento mais umas pistas para eventual meditação de quem sabe. Primeiro, o treinador tem de deixar de teimar nos seus protegidos e ostracizar os preteridos: antes foi o Otávio que só a muito custo e muitos sustos saíu da titularidade, agora é o Namaso, cuja utilidade só ele entende. Mas há mais uma mão cheia deles sempre prontos e entrar e que mais valia estarem a ajudar a equipa B, também em vias de desastre anunciado: André Franco, Vasco Sousa, Grujic, Gonçalo Borges e Eustáquio (sim, Eustáquio, responsável pelo segundo golo do Benfica e mais). E, já agora, Zé Pedro é melhor que Nehuan Pérez e não percebo porque saíu da equipa, e Rodrigo Mora merece muito mais do que o pouco que o treinador se digna dar-lhe. Na Luz, uma equipa sem adultos na sala e uma defesa, em minha opinião, prematuramente aliviada de Pepe, teria merecido reflexão sobre a imaturidade dos laterais face ao que iam ter pela frente: Martim e Moura são ambos bons jogadores ainda em construção, mas nunca tinham jogado um clássico na Luz e pagaram por isso: o primeiro foi devorado por Carreras, o segundo por Di María. Creio – mas é apenas um palpite – que João Mário e Zaidu, bem mais experientes, teriam feito melhor. Mais reflexões: como tirar o melhor partido de Fábio Viera; como servir Samu na zona de finalização; como explicar a Diogo Costa que nas bolas altas na pequena área tem de mandar ele; treinar melhor as saídas de trás com bola para que não sejam apenas momentos inúteis ou de sobressalto; como ter um meio campo rotinado na função principal de abrir espaços na frente, servir o ataque e chegar à zona de remate; como posicionar os melhores rematadores na meia distância e fazer horas extraordinárias com eles até serem capazes de acertar pelo menos 70% dos remates na baliza; como treinar os livres laterais de forma simples e eficaz. E, enfim, eleger um patrão para uma equipa sem rei nem roque: sugiro o Fábio Vieira. Mas insisto num ponto: esta equipa é melhor do que a do ano passado. É verdade que é muito jovem e é pena que tenha sido desconsiderado o contributo que Pepe ainda poderia dar para o seu entrosamento, mas se me parece impossível lutar pelo título, já nada justifica a vergonha que foi perder por 4-1 contra um Benfica que vimos em Munique borrado de medo. Ajudámos a levantá-los das cinzas e a afundarmo-nos nós nelas. Há muito para reflectir e ainda mais para mudar”, escreveu.